Descoberta
Célia Laborne Tavares
Perdida entre a multidão, como flor-de-areia, semi-liberta, vinda ao mundo para procurar; descubro-me. Transponho a ponte, desdobro-me para contar a todos a transformação.
Vinda da nebulosidade, da luta e do cansaço, percebo que é claro o despertar. Vinda da noite, sem estrelas, toco o clarão da lua e sei que a madrugada não tarda. O chão de violetas prateou-se, e a paisagem é de imponderabilidade, de leveza, de susto pelo inesperado do esplendor.
Cedo a Terra nos germina e, em nós, nada se salva senão a luz que emerge do grande abismo, para o grande horizonte. Nada é permanente a não ser o desdobrar e o acordar a cada novo portal, e maravilhar-se pelo continuar.
Perdida como flor do medo e da luta, descubro um dia a identificação com o infinito e a transformação começa então. Caem os obstáculos, as belezas se externam, os apegos se desfazem. Na grande solidão que marca o real conhecimento, os valores são mudados, os alicerces reforçados e as expressões claramente marcadas.
Já sem palavras, chega-se à aurora, já sem forma de comunicação concreta, procura-se trazer as últimas mensagens como se ainda se tentasse transmitir o informal e o indescritível.
Há tempo de falar e tempo de calar. Nesse silêncio começa a si infiltrar e, dentro dele, vamos ser amigos da distância, da luz e da beleza do alvorecer.
Há tempo de chegar e de se despedir. Nosso tempo de permanência vai-se consumindo em palavras adormecidas no estoque do tempo que nos pertence. Começa-se a amanhecer e percebe-se que outra aurora deve ainda renascer.
Já não se sabe como reprimir ou ignorar tanta beleza. Tanto crescer e desdobrar-se vindo do interior. Como rio que transborda ou maré que avança, como o eclodir da planta em plena primavera, sucedem-se os encantamentos. É tão alto o canto da Vida e a magnífica presença é tão forte que já não se suporta apenas a vivência, é preciso também a manifestação, a comunicação.
As internas fronteiras se dilatam como o hino a reboar em infinitos horizontes, num alargamento de paz e integração. Violento crescer do botão, em terra fertilíssima. As germinações da luz transcendem a humana expectativa do contato único e brotam transbordamentos além do sentir, do ver e do ouvir.
A voz transmite a onipresença no Verbo criador, em amorosa e majestosa canção. E o canal por onde jorra a luz também se ilumina. Momentaneamente, um rastro de alvorada se instala, e a mente pára e se assombra, ante a intraduzível beleza que eleva e enleva.
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