segunda-feira, 19 de março de 2012

Aspiração...


Aspiração

Cruz e Sousa*


Tu és a estrela e eu sou o inseto triste!
Vives no Azul, em cima nas esferas,
No centro das risonhas primaveras
Onde por certo o amor eterno existe.

E nem de leve a glória vã me assiste
De erguer o vôo às olímpicas quimeras
Do teu brilho ideal, lá onde imperas
Nesse esplendor a que ninguém resiste.

Enquanto tu fulgires nas alturas
Eu errarei nas densas espessuras,
Da terra sobre a rigidez de asfalto.

Embalde o teu clarão me enleva e clama!
Mas como a ti voarei, se, senti a chama
Sou tão pequeno e o céu tão alto?


(...)

Escrito na calçada do Edifício Anabella Residence
Rua Ferreira Lima . Centro . Florianópolis . SC. Brasil

Lindo, lindo, lindo...

Encontro do poeta ilhéu desterrado em Minas,
e do pé-rapado desterrado das Geraes morando aqui na Ilha...

Suspiro... eu é que fui encontrado por Ele,
enquanto andando cego pelas ruas...
Benzadeus que eu tenho o que é por muitos considerada "deficiência" po-ética...

Chorei... que às vezes andando feito cego pelas ruas,
são os pés que nos fazem re-vi-ver belezuras,
despertando e nos libertando de todos os desterros
para a cidadania cósmica, po-ética, das estrelas...



__________

* João da Cruz e Sousa: poeta brasileiro, alcunhado Dante Negro e Cisne Negro. Considerado um dos precursores do Simbolismo no Brasil.


Nasceu em  Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis/SC) em 24 de novembro de 1861. Ele "subiu" pras Estrelas de Estação do Sítio (Antônio Carlos/MG), em 19 de março de 1898... 


Intão... "caminhei" na poesia dele exatos 114 anos depois, no dia 19 de março de 2012... Apesar do antigo Palácio do Governo aqui na Praça XV de novembro levar seu nome, não houve "nota" nenhuma que falasse de seu aniversário de estrelice nos meios de comunicação. Pois é... PPP, preto, pobre e poeta... Nojento...

A Artista que fez a obra na calçada é Giovana Zimermann. Veja a sequência de fotos da obra, clicando aqui. Conheça mais sobre ela clicando aqui.

Um comentário:

Giovana Zimermann disse...

Olá,
Estava aqui organizando um portfólio quando fui buscar a poesia "Aspirações" do Cruz e Sousa, e encontrei o seu blog, fiquei emocionada!
Que lindo saber que minha obra "Metáfora do esgrimista", lhe tocou tão profundamente! É um retorno maravilhoso! nesta obra deixei-me contaminar pela observação da cidade, do visível e do invisível, da materialidade para o que ela sugere. Como uma " magia evocativa" de Baudelaire que transforma elementos urbanos em uma realidade poética. « Je verrai l’atelier qui chante et qui bavarde ; Les tuyaux, les clochers, ces mâts de la cité, Et les grands ciels qui font rêver d’éternité » (Baudelaire, 1857-1861) Na calçada utilizei o poema "Aspiração" de Cruz e Sousa, o poeta do Desterro. O poema refere-se a uma cidade asfalto, não era o caso de Desterro, provavelmente uma referência a Paris de Baudelaire. Vou compartilhar seu post no http://artepublicaemflorianopolis.blogspot.com.br/
Abraço!
Giovana Zimermann